Quais as expectativas para a economia brasileira em 2024

Ano promete redução dos juros no Brasil, queda da inflação, perspectiva de aumento dos investimentos e permanência da incerteza fiscal

O ano de 2023 começou com expectativas pessimistas para a economia brasileira: “em seis meses estaríamos como a Argentina, em um ano, como a Venezuela”. O boletim Focus de 6 de janeiro de 2023 previa que, ao final do ano, estaríamos com um IPCA de 5,36%, um PIB de 0,78%, câmbio em R$ 5,28 e Selic a 12,25% ao ano. Do ponto de vista político, saímos de uma transição de governo com uma PEC que ampliava os gastos e, por consequência, mantinha as expectativas de inflação e da taxa de juros em níveis mais elevados.

Além das turbulências internas, tivemos aumento da inflação e da taxa de juros nos Estados Unidos, que impactaram os mercados de renda variável tanto lá quanto aqui. Além do impacto na taxa de câmbio, que chegou à cotação máxima de R$ 5,44 em 4 de janeiro de 2023.

Apesar disso, chegamos ao final de 2023 com expectativas positivas. De acordo com o último Boletim Focus, de 26 de dezembro de 2023, chegamos com projeção para 2023 de IPCA em 4,46%, PIB de 2,92%, câmbio de R$ 4,90 e Selic em 11,75% ao ano, com viés de baixa para as próximas reuniões do Copom (Comitê de Política Monetária). A PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) de novembro apresentou resultados também positivos, com uma taxa de desocupação de 7,9% no ajuste sazonal, uma das menores taxas dos últimos 10 anos.

Apesar do otimismo, a (quase) certeza do não cumprimento das metas fiscais acende um ponto de alerta para a economia brasileira em 2024

Já as projeções para a economia brasileira em 2024 para a inflação e juros estão bem melhores, em que pese a, um pouco menos, mas ainda frágil, situação fiscal do país. O arcabouço fiscal, por exemplo, propôs um ajuste nas contas públicas, e promessa de deficit zero para 2024, apesar de termos a (quase) certeza de que não será cumprido. Além disso, contou com a aprovação da reforma tributária, cuja discussão se estende há mais de 30 anos, que tem como crítica principal a quantidade exagerada de exceções, mas que auxiliou no aumento do rating do Brasil pela agência de classificação de risco S&P.

O IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) projetado pelo boletim Focus para este ano é de 3,91% (mais próximo à meta de inflação para 2024, de 3% ao ano, com intervalo de tolerância de 1,5%), e Selic a 9% ao ano. Já para o PIB, a projeção é de leve crescimento, de 1,52%, e taxa de câmbio a R$ 5. O retorno da Selic a um dígito não ocorre desde fevereiro de 2022.

Apesar das perspectivas de corte da Selic nas próximas reuniões, como sinalizado pelo presidente do Banco Central, ainda teremos uma taxa real de juros elevada ao final do primeiro trimestre de 2024. Mesmo assim, a perspectiva de controle da inflação levou a uma redução da taxa longa de juros. A redução da Selic não apenas beneficia o mercado de renda variável, mas também melhora o valuation das empresas, pois a redução da taxa livre de risco contribui para que as expectativas de retorno dos investimentos sejam maiores e que haja uma redução do nível de endividamento.

Esses indicadores levaram a um otimismo maior, com a bolsa batendo recorde histórico, chegando a ultrapassar os 134 mil pontos em 27 de dezembro, a maior alta desde 2019. Consequência das reduções das taxas de juros no Brasil e da manutenção das taxas de juros dos Estados Unidos (terceira reunião seguida com manutenção), que levou a uma pausa na política monetária contracionista que o FED (Banco Central Americano) operou esse ano.

Apesar do otimismo, a (quase) certeza do não cumprimento das metas fiscais acende um ponto de alerta para a economia brasileira. Mesmo com os esforços apresentados pelo Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para o cumprimento do deficit zero, as previsões de gastos do governo foram ampliadas. Além dos reajustes dos servidores, os gastos públicos aumentam em anos eleitorais e, em 2024, teremos as eleições para prefeitos e vereadores.

Em relação aos EUA, o movimento de manutenção da taxa de juros leva os investidores a ampliarem sua tolerância ao risco e a buscarem os mercados de renda variável e os de países emergentes. Esse comportamento beneficia o Brasil, com a entrada de capital estrangeiro na bolsa. Ainda assim, as projeções para a economia americana em 2024 preveem uma desaceleração econômica, com um crescimento de cerca de 1% a 1,5% do PIB. Por outro lado, há quem esteja projetando ganhos na renda real, uma taxa de emprego bastante robusta e um crescimento maior. Ou seja, os EUA podem crescer pouco ou crescer muito, o que confirma a comunicação aberta feita por Jerome Powell na última reunião do FED.

Já a projeção de crescimento da China para 2024, de acordo com o FMI, é mais restrita, algo em torno de 4,6%. A perspectiva de desaceleração gradual da economia chinesa se dá devido à baixa produtividade e envelhecimento de sua população, além dos problemas enfrentados pelo setor imobiliário que impactam negativamente a sua economia e o preço das commodities minerais.

Além de tudo o que foi descrito acima, temos o El Niño, que tem trazido fortes ondas de calor e secas, com temperaturas ultrapassando os 40°C em diversas regiões e chuvas extremas em outras, o que pode afetar negativamente a safra de 2024. Além do agro, há a necessidade de adaptação das cidades e das infraestruturas para as tempestades e ventos. De acordo com estudo do Banco Mundial, os danos à infraestrutura causados pelas mudanças climáticas têm
potencial de afetar o PIB negativamente em 1,3%.

Apesar desses desafios, a perspectiva é que haja aumento dos investimentos para 2024 devido à redução das taxas de juros, a melhora das condições de crédito e a demanda reprimida. O ponto negativo é o nível de endividamento da população e das empresas e a consequente restrição de crédito decorrente disso, que pode fazer com que o crescimento dos investimentos e do consumo seja mais contido. Ainda assim, o aumento dos investimentos é fundamental para ampliarmos a produtividade e a competitividade do Brasil.

Terminamos 2023 melhor do que esperávamos no início daquele ano, e as expectativas para a economia brasileira em 2024 podem ser classificadas como “neutras, com viés de alta”. As incertezas acerca do cenário externo, em relação ao cumprimento das regras fiscais e às possíveis restrições de crédito, nos levam a ter mais cautela. Por outro lado, o controle da inflação e a redução da taxa básica de juros ampliam a possibilidade de investimentos. O atual governo segue tendo muitos desafios a enfrentar.

Renata Moura Sena é professora de economia da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo).

Fonte: Nexo Jornal

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